quarta-feira, 19 de maio de 2010

48 horas

Dois dias, duas noites. Intermináveis feito um buraco negro - tão negro que não conseguimos definir o que é escuridão. Entro no elevador já com meu celular na mão esperando não sei o que, não sei nem que atitude, somente esperando... o nada.
Com a respiração já falha e as mãos suadas, ele para no quarto andar. "É ela" - penso - "ou não". ERA! Ai meu Deus, o que dizer? Eu esperava como nunca por esse momento e agora que aconteceu não saía nada, nem mesmo um sussurro. Tudo bem, mantenha a calma, faça um gesto de "oi" com a mão, deve servir.
Depois de três longos segundos ela sorri - um sorriso amarelo, mas que valeu. Eu retribui o sorriso com um mais amarelo ainda, por incrível que pareça. Ela virou para frente, mexeu no cabelo e seu cheiro entrou em mim de forma estranha e única - impregnou. Tensão, faltavam TRÊS ANDARES para o encontro acabar, TRÊS ANDARES!
Um vazio passava como pensamento na minha cabeça, como um grito de "FALA ALGUMA COISA!". Respirei, e já passando pelo andar da garagem, falei, ainda cabisbaixo:
- Bom dia!

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Sem título

"Não tenho tempo para mais nada, ser feliz me consome muito."

Vejo-me num momento que nem mesmo sonhei - mamãe sonhou para mim, na verdade. Eu não estou sorrindo, nem mesmo minhas covinhas aparecem no canto da boca. Vestido branco, véu, grinalda e uma cara de choro olhando para o altar da igreja.
Porém, antes de você me deixar continuar, pretendo rir, afinal, estou mentindo. Não é necessário, pelo menos a mim, casar num sonho "alegre" (e ao mesmo tempo, irreal) de minha velha senhora para ser feliz.

Estou a olhar rosas brancas e vermelhas, mas não em um buquê e sim, espalhadas no jardim - seja ele verdadeiro ou não. Ao longe, atrás da cachoeira, um menininho rechonchudo corre, e muito. Fugia de um bando de abelhas (não cabe o coletivo aqui, já que este reduz demais o número delas, acredite) que teimavam em seguir ... seu cheiro.
Tudo bem, estou vestindo um vestido branco, mas ele é curtinho e cheio de bolinhas vermelhas. De repente, estou numa festa: música dos Beatles ao fundo, e eu fecho os olhos, sentindo o som. Estou então a sorrir. Estou vivendo, não me peça para acordar.
Viva comigo, vem!

Por hoje é só

Fale, pode ser tarde.
Empreste-me então seus ouvidos - juro que é só por um momento.
Antes de mais nada, se quiser, me olhe nos olhos, nem que seja de relance. Quando digo a você (seja você quem for) que a vida não é fácil, afirmo ainda um pouco mais que não é para ser fácil. Ter que ouvir o quanto viverás pode ser difícil, mas olhar para aqueles com os quais você quer viver é quase impossível.

Impossível: que não pode realizar-se.
Palavra pequena que se apossou de minha vida, assim como a palavra amor.
Amor: afeição profunda a outrem, dedicação extrema e carinhosa, afeto, zêlo, ternura.
Engraçado que não acho que o dicionário é capaz de defini-lo. Não o julgo, mas não o apóio. Só podemos definir o amor quando começamos a senti-lo.

Respire, feche os olhos, expire. Sentes o amor que tenho por você? Está solto no ar, preso nas palavras e inteiramente em meus olhos.
Antes de acabar a carga de minha caneta, posso dizer-lhe que quando choro (e não me culpes por tal ato), é o meu amor que quer se tornar água para, assim, tornar-se indispensável.

domingo, 9 de maio de 2010

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Era com a morte que eu conversava. Ela tinha uma voz calma, mansa. Puxava-me e colocava-me em seu colo acolhedor e confortável.
Em nosso longo diálogo, contou-me sobre sua própria experiência de vida e até mesmo sobre sua morte - dura, impactante, que mudou o mundo - e trouxe à tona antigas lembranças.

Durante um tempo, passou a mão em meus cabelos e foi quando eu me senti mais "distante do mundo". Foi como estar prestes a pegar no sono: sua mão leve alisava cada fio do meu cabelo ainda remexido depois do banho, seu rosto vinha de encontro ao meu para ter certeza que nenhuma lágrima cairia, e meus olhos relutavam para não fechar. Convidei-a a entrar no meu quarto, para uma conversa mais reservada e ela aceitou sem hesitar.

Disse que me levaria ao paraíso e que meus problemas logo passariam. Não eram só promessas da boca para fora, eu acreditava de olhos vendados em cada palavra. Problema eu traria para os demais, foi o que ela me alertou logo depois de ver um sorriso que enchia minha face enquanto eu pensava em como seria bom me livrar de tanta dor. Eu fiquei imaginando durante uns bons minutos em como deveria ser esse lugar... Ela me mandou parar de sonhar. Abri os olhos e lá estava ela ao meu lado, me convidando novamente ao paraíso. E para lá eu fui.
O problema é que eu não sei os próximos capítulos.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Embriaguez

Embriaguez. Bebo da vida árdua sem cor nem fundo. Vívido. Límpido como copo de vinho. Vinho tinto. Cálice. Faz-me lembrar da igreja – padres, freiras, irmãos; não de sangue, mas de coração, digo, num só coração. Filhos do mesmo pai, condenados a um só caminho – medo talvez de muitos, salvação talvez de todos.

Olhos negros da noite a me observar na sala em frente à televisão – parada, assustada. O jornal passa, o tempo passa. As notícias pioram, uma lágrima cai. Sobrevoa um desgosto humano e irrevogável que me faz cair em si e perceber que nada fiz, nunca faço. Incrivelmente me vejo num barril de pólvora de onde ninguém pode me salvar. Vejo-me de luto em frente à mesma igreja, luto visivelmente por coisas alheias e ao mesmo tempo por todas as coisas. Não quero perder a sã consciência que um dia me foi dada – sabiamente - e que contraditoriamente não sei segui-la, assim como não sigo minhas próprias pegadas, de homem grande e humanidade fraca.
Abro a porta de casa, tudo escuro está até o momento.

A luz – ah, a luz! Faz-me refletir. Pensar nos meus antepassados. Faz-me agradecer. Pensar claramente e lentamente em cada processo árduo que fez tal indigente criar uma geringonça tão útil.
Como sou tola! Tola às vezes por parar de falar e ouvir os pensamentos de um ser que nem sabe se humano é, não sabe simplesmente por tomar atitudes feito um animal, de quatro patas ou talvez de duas, nunca se sabe. Tola ainda por escrever seus pensamentos numa folha de papel e por mais. Porém retomo esses inatos pensamentos - e muitas vezes até inglórios – e me vejo numa situação delicada. Ligar ou não a lâmpada da sala. Provavelmente minha imaginação vai ao longe, ela diz que estou errado, retruco. Eu penso além, além até do próprio pensamento: mais tarde algum indivíduo, em algum lugar do planeta pode precisar dessa energia gasta desnecessariamente, mas meu inconsciente me diz o que provavelmente é certo, para ele, logicamente. Ele, vagarosamente caminha pela minha cabeça e sonda o que penso a respeito do assunto e me faz sentir que talvez esteja certo, mas não muito. Errado um pouco, certo um pouco menos. Reparo então que só me resta dormir, afinal, energia nenhuma será gasta. Eu rio e paro por aí. Fim do dia.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Foi num domingo. Se me lembro bem, eram três e meia da tarde quando mamãe me chamou:

- Vem lanchar, meu filho!
Eu, sem vontade de nem mesmo sair da cama, mexi a cabeça em sinal negativo. Ela retrucou, me puxando e me fazendo sentar à mesa da cozinha.

- Não tenho fome. - seu olhar perfurou meus olhos e eu chorei.

Ela se desesperou e resolveu me consolar. Eu pedi para ir para o quarto, tentando me acalmar de alguma forma ainda desconhecida pelo meu próprio eu. Nada adiantava: nem uma música alegre, um bom livro de comédia, nada.

- O que houve, querido? Brigou no colégio? Tirou nota baixa? - silêncio. Já sei então ... uhm ... recusaram o seu amor, meu filho?

- Não, mamãe! Descobri que sou amado. Assim, sem querer ...